Apenas, o melancólico fim do futebol dos 27 Estados, o esvaziamento e a ausência dos nossos melhores jogadores jovens vendidos aos clubes do exterior, a permanência de muitos veteranos quarentões “masters” nos gramados e a falência dos próprios clubes conspiradores, com raras exceções.
Nos capítulos anteriores, já contamos a triste situação do que restou do futebol brasileiro das regiões interioranas dos Estados golpistas do Sul e Sudeste. Antes de entrarmos na história do futebol dos tristes trópicos setentrionais do norte, nordeste e centro-oeste, faremos uma retrospectiva de como tudo começou em meados dos anos oitenta.
Até meados da década de oitenta, o campeonato brasileiro de futebol da primeira divisão (correspondente a atual série A) era composto por uma média de pouco mais de 40 clubes, reunindo os campeões e/ou vice-campeões de todos os Estados e outros grandes clubes dos Estados líderes.
Como as unidades federativas mais ricas tinham uma quantidade maior de grandes clubes, São Paulo e Rio de Janeiro entravam com os seus cinco ou seis grandes, às vezes até com 8 ou 9, como eternos manda-chuvas, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Pernambuco com dois ou três cada e os demais Estados de portes médios e pequenos com dois ou um, dependendo do peso políticos de cada federação.
Deste modo, eram acomodados todos os principais grandes clubes de todos os Estados brasileiros, cujas indicações se baseavam nas conquistas dos títulos estaduais ou na classificação final dos campeonatos até o número estipulado de clubes, no caso dos Estados mais ricos.
Este modelo de campeonato vigorou por cerca de 15 anos entre 1971 e 1985 e foi um grande sucesso de bilheteria, com uma média de público superior a 18.000 torcedores nos estádios, com a população brasileira variando entre 70 e 100 milhões de habitantes. Os campeonatos estaduais eram super motivados pela presença dos melhores de cada Estado na grande festa do futebol nacional. Às vezes em épocas de grande influência da política partidária, os dirigentes perderam a lucidez e chegaram a enfiar 54, 62, 74 e até 94 clubes, variando do desequilíbrio até o desvario político total, mas, logo, caíam na real e consertavam os erros. A média boa sempre esteve em torno de 44 clubes, com metade para os poderosos do sul-sudeste e metade para os demais Estados.
A partir da segunda metade da década de setenta, as nascentes redes nacionais de televisão começaram a disputar o televisionamento direto dos jogos das fases finais dos certames nacionais, cuja audiência era imbatível e atraia grandes anunciantes para o setor.
Entre 1975 e 1985 os valores dos contratos assinados entre os clubes finalistas e as redes foram crescendo de modo exponencial e os grandes clubes do Rio e São Paulo, juntos com os comissionados da mídia esportiva, cresceram os olhos para abocanhar o grande bolo financeiro no seu total e a gorda comissão de 20% estipulada para os agenciadores mercadológicos das publicidades televisivas e das propagandas estáticas.
Nesse período, um dos nossos ícones da chamada crônica esportiva, o jornalista Juca Kfouri, na época editor da Revista Placar, começara a dar vez e voz aos principais dirigentes dos grandes clubes, reunindo-os na editoria da famosa revista para uma conspiração aberta contra os médios e pequenos clubes das demais regiões brasileiras. Entre os conspiradores convidados para as macabras reuniões estiveram presentes os futuros dirigentes e fundadores do Cartel dos Treze, Márcio Braga, Carlos Miguel Aidar e Paulo Maracajá, além do ex-Presidente da FPF-SP, Nabi Abi Chedid e o ex- CND, o Sr. Manuel Tubino, os mesmos, que tiveram grande influência na redação das Leis Pelé e Zico.
O objetivo maior dessa legislação era desarticular a influência federativa dos Estados de menor porte econômico na política esportiva do país com a extinção dos Conselhos Estaduais e Nacional dos Desportos para formar um Conselho Superior com a presença maciça dos representantes das regiões dominantes, impor a vontade do Clube dos Treze em toda a política futebolística do país, facilitar o ganho dos influentes empresários de jogadores nas transações com exterior com o fim da lei do passe e drenar todos os recursos dos esportes para o sul-sudeste do país. Os representantes do norte, nordeste e centro-oeste, enquanto isso, dormiam o sono dos justos e preferiam as suas partes em gorjetas e honrarias duvidosas.
Nas principais redações dos departamentos de esportes do eixo, crescia a ambição para colocar às mãos nas crescentes verbas da televisão, entre jornalistas esportivos, “marketeiros” e publicitários.
Logo após e eleição para a Presidência da CBF, o Vice-Presidente eleito assumiria o comando da entidade com o afastamento por doença do titular eleito, o ex-Presidente da Federação Carioca de Futebol, Otávio Pinto Guimarães. Contaremos, também, aqui nos próximos artigos, a história dessa fraudulenta e tumultuada eleição para o comando do nosso futebol.
Com a cabeça feita pela conspiração dos grandes clubes, o velho timoneiro paulista foi logo criando as futuras divisões inferiores do nosso futebol, com o intuito de segregar os grandes clubes no topo e despachar os clubes dos Estados de menor porte econômico para a rabeira das futuras séries B e C. Assim, no seu primeiro ano no comando, criou os famosos módulos coloridos, num balão de ensaio para ludibriar os otários malas das regiões a esvaziar.
No ano seguinte, seriam todos rebaixados. Mas, os grandes clubes não ficaram satisfeitos com a manobra da CBF para ficar com o comando dos contratos da televisão.
Assim, no fatídico ano de 1987, há exatos 20 anos, nascia o começo da desgraça que viria a se abater sobre o nosso futebol. O Cartel dos Treze e a ditadura vitalícia das federações.
A partir do momento que os treze maiores clubes passaram a dividir, praticamente, todos os recursos do futebol entre eles, nenhum outro clube brasileiro dos 27 Estados ou Federação Estadual de Futebol ou qualquer clube dos mais de 5.000 municípios, teria qualquer futuro. E a metodologia é simples e sem rodeios. A televisão arrecada milhões das publicidades nacionais de um “pool” de portentosos anunciantes que vendem os seus produtos em todo o país e os recursos contratados são divididos, exclusivamente, entre os 13 clubes privilegiados de apenas quatro áreas metropolitanas dos respectivos Estados. Os clubes e federações do resto do Brasil simplesmente não existem.
Com a dinheirama em mãos eles passaram a dominar todos os campeonatos estaduais, regionais, nacionais, continentais e internacionais, as verbas das loterias federais, açambarcar todos os torcedores consumidores e todos os mercados nacionais de produtos licenciados, no maior cartel econômico que se tem notícia no mundo. Tudo ao arrepio das leis brasileiras, da Constituição Federal e dos mais comezinhos dispositivos de respeito federativo do país, sob os olhares contemplativos de toda a comunidade futebolística e representativa parlamentar. O poder absoluto corrompe e o poder absoluto irrestrito e sem oposição, corrompe, absoluta e totalmente.
Apenas para exemplificar o verdadeiro massacre implantado, os 13 clubes ficam com R$ 500 milhões dos principais campeonatos que dividem entre si, com todas as verbas das loterias federais arrecadadas pelos apostadores dos 27 Estados e todos os principais contratos publicitários e 90% dos consumidores e os demais 500 clubes do Brasil ficam com um contrato ridículo de R$ 20 milhões da série B e as migalhas e esmolas concedidas a título de ajuda para translado e hospedagens para parte dos clubes miseráveis da série C.
Quem quiser sobreviver que peça ajuda às prefeituras e aos Governos Estaduais, pois o futebol brasileiro nos pertence e aqui quem manda somos nós. Todos terão que obedecer ao nosso calendário e trabalhar em função dos nossos ganhos e do nosso desenvolvimento. Quem se meter a besta de organizar qualquer campeonato fora das nossas imposições serão expulsos da corporação, exemplarmente punidos, expulsos ou extintos.
Essa história completa, entretanto, contaremos nos próximos artigos, após a história da eleição de 1986.
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