Em 1821, provavelmente, o Padre Manuel Aires de Casals, Presbítero Secular do Gram Priorado do Crato, compôs uma obra insuperável sobre a geografia, a história e a paisagem brasileira.
Publicada pela imprensa régia do Rio de Janeiro, com licença e privilégio Real, como consta do frontispício da primeira edição, essa obra denominava-se “Corografia Brasílica ou Relação Histórico-Geográfica do Reino do Brasil”, sendo composta e dedicada a Sua Majestade Fidelíssima, o Rei de Portugal.
Por não constar à data no frontispício da primeira edição, os pesquisadores da Universidade de São Paulo que escolheram a obra para uma re-edição especial, pela sua importância, em 1976, têm, eles próprios, dúvidas com relação à data de publicação do original, se em 1754 ou 1821.
Comparando o conteúdo geográfico e histórico da obra com o Mapa da Comissão da Carta Geográfica do Vice-Reino do Brasil de 1763, dado a conhecimento pelo historiador Francisco Adolfo de Vernhagen, o Visconde de Porto Seguro, em seu livro de História Geral do Brasil de 1849, não se sabe, em termos geográficos, quem copiou a quem.
A obra do padre Casals, muito mais abrangente e com conteúdos nas áreas de História, Geografia, Botânica, Zoologia e Descrições de Viagens, contém no campo geográfico, entretanto, as mesmas descrições do mapa da referida comissão de 1763. Donde, se deduz, que os membros da comissão que elaborou o mapa beberam a sua sabedoria na obra do padre, escrita, provavelmente, em 1754, mas, somente publicada em 1821.
Feitas essas considerações, para deixar os leitores tirarem as suas próprias conclusões, entremos no assunto objeto do título deste trabalho.
Toda essa celeuma em torno do re-ordenamento territorial do Estado do Pará havia sido ali, na obra do Padre Casals, iniciada, quando o autor divide a antiga Província do Grão Pará, um século antes da emancipação da Província do Amazonas, em Províncias, Distritos e Subdistritos.
Tanto a emancipação do Amazonas, quanto às futuras tentativas de se criar novas unidades territoriais e federativas na região amazônica, a partir dos estudos de Fausto de Souza e de inúmeros outros estudiosos do assunto, que se lhe seguiram, se baseiam nas subdivisões do Padre Aires de Casals.
O presbítero dividia a região em cinco Províncias, Mato Grosso, Pará, Goiás, Maranhão e Solimões. Em seguida, subdividia essas províncias em distritos e subdistritos, as quais, foram dando origem aos novos Estados da paisagem brasileira contemporânea, conforme segue:
Essas subdivisões deram origem aos Estados atuais de Mato Grosso (Distritos Norte e Médio sem uma parte de Juruena), Mato Grosso do Sul (Camapuânia e parte da Caiapônia, originalmente, território de Goiás) e Rondônia (parte de Juruena), além, dos atuais pedidos de emancipação que tramitam no Congresso Nacional, dos Estados do Araguaia ou Mato Grosso do Norte e Aripuanã, compostos pelos distritos de Arinos, Tapiráquia, e parte da Bororônia e Juruena.
Essas subdivisões deram origem aos atuais Estados de Goiás e Tocantins (Nova Beira e Tocantins) e aos atuais pedidos de emancipação do Triângulo (Caiapônia e Paranã), hoje incorporado ao território de Minas Gerais. O subdistrito de Rio das Velhas, na margem direita do Rio São Francisco, próximo a Belo Horizonte, foi, também, integrado às Minas Gerais.
Essa subdivisão do Grão Pará deu origem aos atuais Estados do Pará (Pará Próprio, Xingutânia, Tapajônia e parte da guiana oriental e da Mundrucânia oriental), do Amazonas (Parte da Guiana Ocidental, Segundo Distrito Sul e Mundrucânia ocidental), Amapá (Parte oriental da Guiana Ocidental – 2º Distrito) e Roraima (parte norte da Guiana Ocidental).
Também se incluem nessas subdivisões, os atuais pedidos de emancipação dos Estados de Carajás (Xingutânia), Tapajós {Tapajônia, Mundrucânia oriental e parte ocidental da Guiana Oriental - 2º Distrito - (Baixo Amazonas)}, Juruá (parte ocidental do 2º Distrito Sul), além dos Territórios Federais de Solimões (Parte oriental do 2º Distrito Sul), Rio Negro (Parte ocidental do 1º Distrito Norte da Guiana Ocidental) e finalmente o Madeira (Parte ocidental da Mundrucânia).
O Território Federal de Marajó estava incluído no Pará Próprio e somente surgiu nos estudos de Samuel Benchimol em 1967, posteriormente, aperfeiçoado em 1977.
Já na Província do Maranhão, as divisões correspondiam às primeiras comarcas do futuro Estado, não havendo distritos.
Veja o Mapa abaixo, que corresponde aos estudos do Padre Manuel Aires de Casals, reproduzido pela Comissão da Carta Geográfica do Vice-Reino do Brasil de 1763, para você entender melhor as subdivisões acima.
Mapa da Comissão da Carta Geográfica do Vice-Reino do Brasil de 1763, provavelmente, baseado nos estudos do Padre Manuel Aires de Casals de 1754, em sua obra publicada em 1821 denominada "Corografia Brasílica ou Relação Histórico-Geográfica do Reino do Brasil", reeditada pela Editora da Universidade de São Paulo/Livraria Itatiaia Editora Ltda. São Paulo, 1976.
Vários estudiosos se debruçaram sobre as obras do Padre Casals e da Comissão da Carta Geográfica e elaboraram inúmeras propostas de criação de novas Províncias e Estados e Territórios Federais na antiga Capitania do Grão Pará e em todo o Brasil, entre os quais, o próprio Visconde de Porto Seguro (1849), Fausto de Souza (1850-1880), Everardo Backheuser (1933), Segadas Viana (1933), Teixeira de Freitas (1933-1948), Juarez Távora (1935-40), Ary Machado Guimarães (sem data), Antonio Guerra (1960), Siqueira Campos (1966), Comissão da Amazônia Legal (1966), Samuel Benchimol (1967 e 1977) e Comissão de Estudos Territoriais da Constituinte de 1988 (1992-1995).
Por que tantos brasileiros estudaram em detalhes esses problemas do re-ordenamento territorial e político-administrativo, e não as Assembléias Legislativas, dos Estados do Pará, do Amazonas e do Mato Grosso, diretamente, interessados no assunto, ou mesmo, os técnicos do Governo Federal, após a tranqüila divisão do Estado de Goiás.
A iniciativa pela realização de estudos sérios e científicos sobre um assunto de tamanha importância para o Brasil poderia ter partido dos poderes executivos dos três Estados acima citados, em colaboração com os poderes legislativos correspondentes, até para que os seus Estados não viessem a serem lesados na partilha territorial empírica feita por parlamentares, sobre pressão da população.
Essa iniciativa teria dado ares oficiais aos estudos, que chegariam ao Congresso Nacional com a chancela das autoridades máximas dos Estados responsáveis.
Entretanto, o preconceito contra o tema e o medo de discutir assuntos polêmicos e melindrosos, fez com que a população, premida pelo abandono e pela sobrevivência forçada e pelos parlamentares acudindo aos anseios e angústias dos seus representados, empunhassem essas bandeiras do aperfeiçoamento territorial do País.
Sob a liderança dos respectivos governadores estaduais, os técnicos especializados em cartografia, economia, política e assuntos ambientais e fundiários, poderiam ter feito projetos técnicos aprofundados e encaminhado para a discussão nas Assembléias.
Também, na área federal, os técnicos, se antecipando aos anseios da população brasileira, poderiam ter elaborado projetos semelhantes, através da ação coordenada dos Ministérios da Integração Regional, da Fazenda, do Planejamento e da Reforma Agrária, em conjunto com os órgãos de Geografia e Estatística (IBGE), Meio-Ambiente (Ibama) e Proteção ao índio (Funai), encaminhando os projetos neste sentido, com o apoio dos técnicos estaduais, para elaboração de leis complementares.
Agora, o assunto está nas cidades, nas ruas, nos becos, nos botecos e no corre-corre do parlamento.
Temos absoluta certeza, de que, se sentassem numa mesa, os parlamentares federais interessados, os deputados estaduais e os técnicos governamentais nos níveis, estaduais e federais, essa re-organização da administração do país sairia em menos de um semestre e tudo já estaria resolvido, tecnicamente.
Por exemplo. Se o Município de Altamira, que é, territorialmente, maior do que os Estados do Amapá e do Ceará prefere ficar no Estado do Pará, juntamente, com Itaituba e os municípios do extremo sudoeste do Estado e não no Estado de Tapajós, poderia ser feito um plebiscito de menores proporções, apenas nestes poucos municípios. Para isto, bastaria um pedido formal do executivo paraense aos parlamentares da bancada federal para interpor um pedido de Decreto Legislativo visando à aprovação do referido plebiscito.
Neste caso, o território do Estado do Pará continuaria ou não, com um território muito maior, com cerca de metade do atual território, o que, convenhamos é, absolutamente mais justo do que a atual partilha feita de afogadilho. Enquanto, os novos Estados de Tapajós e Carajás, ainda ficariam enormes.
Estamos falando de negociação. A importância desse assunto para os paraenses e para os brasileiros comporta negociações de altíssimo nível e não intransigências. Tudo seria, uma questão de conversa e entendimento, diálogos sinceros, discussões com civilidade e o assunto, que é de interesse de toda a população paraense e brasileira seria encaminhado de forma correta e técnica.
Na falta do diálogo, de vontade política e com o autoritarismo arraigado dos governadores, as partes entram em conflito, e se põem a deitar falações isoladas ou entrar em discussões emocionais estéreis e inúteis, que apenas levam a exacerbação dos conflitos, sem nada resolver de concreto.
Neste instante de bate bocas intermináveis, nossa sugestão é que de ordem dos senhores governadores e com a chancela do Presidente da República, seja composta uma Comissão regional do mais alto nível, composta por técnicos dos três Estados e do Governo Federal, aproveitando a nova instalação da Sudam – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia e coordenada pela mesma, para que se faça uma proposta oficial sobre o assunto.
Evidentemente, não é para a comissão demorar um século estudando o assunto para tomar uma decisão, considerando que os assuntos já estão bem encaminhados pelos parlamentares interessados, mas, que seja elaborada uma proposta técnica e de consenso entre as partes, apenas aparando as arestas e ouvindo as partes interessadas, com audiências especiais com técnicos governamentais, parlamentares, secretários, ministros e governadores.
Também sugerimos, que os estudos técnicos corram em paralelo com os trâmites dos projetos já em estado adiantado de aprovação no Congresso Nacional, para que os mesmos não sofram solução de continuidade, nem retrocesso. Assim, mesmo que os referidos projetos fossem aprovados, os estudos técnicos e econômicos poderiam ser ajustados às novas negociações, de modo que, todos saíssem satisfeitos e sem prejuízos nas suas expectativas e que não restassem mágoas e ressentimentos entre irmãos em Pátria.
Temos absoluta certeza que dentro de um semestre, no máximo, tudo seria resolvido a contento. Não se pode discutir um assunto dessa magnitude, com as partes engalfinhando-se num jogo de gatos e ratos, onde cada parte isolada acha que é mais inteligente e matreira que a outra, semeando armadilhas e legislações espúrias para o tropeço da outra ou blefando no escuro como num jogo de cartas.
Fica aqui a sugestão de um modesto estudioso do assunto que deseja apenas colaborar com as partes em conflito, o qual, observa o acirrado debate ao largo e numa cômoda condição de cidadania.
Postado por Roberto C. Limeira de Castro às 21:25
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