Atento às discussões sobre a criação de novos Estados no Brasil há cerca de 30 anos, pudemos acompanhar os calorosos debates em torno da emancipação de Mato Grosso do Sul, Tocantins, Amapá e Roraima, além das frustradas tentativas de admissão à União Federal do Estados de Tapajós, Maranhão do Sul, Triângulo, Santa Cruz, Juruá e São Francisco durante a Assembléia Nacional Constituinte de 1988. Agora, acompanhamos e participamos intensamente do monólogo dos que desejam a emancipação de Carajás, Araguaia (ou Mato Grosso do Norte), Minas Norte e da criação de quatro Territórios Federais plausíveis, Marajó, Juruá, Solimões e Rio Negro.
Quando falamos de monólogo não estamos exagerando, porquanto, aos argumentos econômicos, sociais, técnicos, político-administrativos e geográficos dos que desejam um Brasil mais equilibrado, apenas se contrapõem às mistificações vazias e às mentiras deslavadas dos defensores de “status quo” e do atual estágio de esgarçadura do tecido social brasileiro.
Os argumentos dos dois lados são, absolutamente, os mesmos de há séculos. De um lado, os porta-vozes das cortes dos gigantescos e ingovernáveis territórios reclamando de que os movimentos não são do povo, mas, de uma elite interessada nos cargos públicos e em seus salários – e quem disso usa, disso cuida – e do outro, as legítimas lideranças libertárias, porquanto, receberam milhares de votos da população que representam, se esgoelam no parlamento para exigir melhorias diante do abandono a que estão submetidas os seus representados.
Pelo desfecho da história, os defensores do indefensável, mesmo levando uma sonora goleada histórica, manobram desesperadamente para ganhar o máximo de tempo que puderem nos seus privilégios de concentração de rendas. É o velho cabo de guerra entre os que almejam o progresso da humanidade e os que querem mantê-la no atraso, apenas vislumbrando a sua míope ótica individualista.
Quem se der ao prazer de ler as histórias do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e de Alagoas com relação à Capitania de Pernambuco encontrará o mesmo debate há dois séculos entre as elites da corte de Recife e a libertação dos visinhos extorquidos, após o açambarcamento em 1799 das três primeiras Capitanias e do movimento de emancipação das mesmas e da emancipação da Comarca de Maceió.
E assim, sucessivamente, ao longo de toda a nossa história. Porto Alegre se aliou a Desterro (atual Florianópolis) na emancipação de Santa Catarina e de São Pedro do Rio Grande (atual Rio Grande do Sul) na batalha contra o jugo dos paulistas e cariocas.
O Paraná somente emancipou-se dos paulistas, cerca de 120 anos depois da drenagem de suas economias, o mesmo acontecendo com Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso em relação à Capitania de São Paulo e do Piauí contra São Luis.
Assim, também, foi o sofrimento da emancipação do Amazonas em relação à Belém, de Rondônia e Mato Grosso do Sul em relação à Cuiabá e Tocantins em relação à Goiânia.
No caso das comarcas de Ilhéus e Porto Seguro que já tiveram “status” de Capitanias, além da comarca de São Francisco, a pendenga se arrasta pelos cinco séculos de nossa história.
São Francisco saiu das garras de Recife e foi presa fácil de Salvador, enquanto as duas ex-Capitanias do sul da Bahia, empobrecidas pelos ataques dos Aimorés, foram simplesmente tragadas pelo apetite fiscal dos Governos Gerais da Capital baiana.
Menos sorte não teve a comarca de Paracatu nos sertões da Farinha Podre (região do triângulo mineiro), que imprensada entre quatro gigantes, Pernambuco ao norte, Goiás a oeste, São Paulo ao sul e Minas Gerais ao leste, ficou trocando de exatores das receitas fiscais públicas até os dias atuais. Mesmo assim, os “triangulinos” não desistem da criação do seu Estado.
Apesar dessas inúmeras vitórias e derrotas históricas acima citadas, o Brasil tem muito que realizar nesse campo da concentração territorial como extensão inequívoca da concentração de riquezas e da espoliação fiscal.
A concentração territorial que leva à concentração de terras, de latifúndios, de riquezas e da população amontoada em exíguos nichos urbanos do país tem sido ao longo dos séculos a principal responsável pelo atual estado caótico, de exclusão social e violência das grandes áreas metropolitanas brasileiras.
Extorquidas dos seus direitos mínimos às instituições republicanas, à democracia representativa, à ordem e ao progresso estampados em nosso pavilhão auriverde e a uma vida digna, os brasileiros das áreas abandonadas migram em massa para a miséria e a exclusão social das favelas e guetos dos grandes conglomerados metropolitanos.
E de nada adianta os brasileiros ficarem esbravejando contra o banditismo galopante, chorando pelos seus milhares de jovens entre 20 e 25 anos trancafiados nas prisões, do caos aeroportuário, da falta de estradas, de saúde, de educação, de transportes urbanos, de polícia, de justiça etc.
Todo esse caos está diretamente relacionado com a arcaica, anacrônica e ultrapassada divisão territorial e político-administrativa do Brasil, cujo equacionamento se arrasta por séculos.
De nada adianta o Brasil ter um território, gigantesco, riquíssimo em recursos naturais, terras férteis, florestas imensas, minérios sem fim e rios caudalosos, se a sua elite, conservadora, egocêntrica, caolha e hipócrita, continua espremendo os seus filhos desprotegidos e sem cidadania em barracos fétidos e amontoados ou em presídios em petição de miséria.
E não tenhamos mais dúvidas a esse respeito. Os que defendem a atual conjuntura político-administrativa e territorial do país foram, são e serão, os únicos responsáveis por tudo de ruim que aqui descrevemos.
Os números falam por si próprios. Enquanto cerca de 95 milhões de brasileiros vivem, precariamente, sem as instituições republicanas em 97,7% do seu território, os outros 95 milhões se espremem em 2,3% ou cerca de 200.000 Km² no caos e na violência das 30 ou 32 áreas metropolitanas, com metade deles, também, sem os benefícios da República, já proclamada há 108 anos.
A Organização das Nações Unidos, já advertiu, oficialmente. Serão nove bilhões de seres humanos vivendo em sua maioria nas áreas urbanas em 2050, dos quais, mais de metade viverão em 375 mil favelas existentes no mundo. Na proporcionalidade, o Brasil terá 145 milhões de brasileiros vivendo espremidos numa área menor que o Japão e a outra metade no vazio de 15 Franças.
Essa é a cruel conjuntura que cerca de 100 heróicos brasileiros da Frente Parlamentar pelo Re-ordenamento territorial e político-administrativo do Brasil tentam aperfeiçoar no Congresso Nacional e denunciar à população brasileira.
Quarenta e três anos passam como num passe de mágica. Por favor, senhores governadores, senadores, deputados, ministros e o Presidente da República e principalmente, os concentradores de riquezas, não vamos mais esperar meio século e inviabilizar o país em todos os sentidos para sempre.
Roberto C. Limeira de Castro
3 comentários:
O MARANHÃO DO SUL NA “VEJA”
EDMILSON SANCHES
Quando o assunto é redivisão territorial do Brasil, as pessoas que são contra sacam logo do bolso dois únicos argumentos: 1) vai aumentar a roubalheira, a corrupção; e 2) o País não tem dinheiro para pagar a sua parte da conta (construção, instalações, equipamentos e manutenção de órgãos governamentais e remuneração de servidores).
Sou defensor da redivisão, mas não é isso o que me leva a concluir o quanto esses argumentos são frágeis, ou, no mínimo, apressados. Em relação à corrupção e roubalheira em novos estados, vale lembrar que elas têm a idade do ser humano, que sempre quer mais, mesmo quando se encontra no Paraíso. Se o volume de roubalheira e corrupção, calculado em reais ou em dólares, fosse vinculado à redução das endodivisões (redivisão dos Estados), São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília sequer existiriam, ou tornariam ao estado de natureza. Neste país se rouba do povo desde sua descoberta -- basta citar os quase R$ 700 bilhões em corrupção e desperdício levantados em reportagens do jornal “O Dia” (RJ) em 2002.
Quanto à inexistência de recursos para implantação dos novos estados, diga-se que grande parte do dinheiro que a União investiria (é isso mesmo: investimento, não gasto) retornaria aos cofres do Tesouro Nacional. São altos os impostos incidentes sobre os materiais de construção (perto de 40% no cimento, na tinta e no vaso sanitário e 37% no tijolo). Em uma casa popular de R$ 45 mil os impostos “comem” R$ 22.275,00. E mais impostos sobre os móveis, as instalações e até o material de expediente e, em especial, sobre a folha de pagamento dos funcionários. Some-se a isso o custo do consumo, os tributos embutidos nos preços dos bens, produtos e serviços pagos com a massa salarial e outros ganhos -- impostos que vão de 18% na carne e no feijão, 40,5% no açúcar, a até 56% na cerveja e 83% no litro de cachaça.
Portanto, vale repetir, se o Governo Federal investir R$ 1,9 bilhão em cada novo estado, ele teria esse valor de volta logo logo, e com “juros”, pois a nova dinâmica econômica que se desenvolveria na nova unidade federativa aumentaria o bolo dos impostos para os cofres públicos, sem falar nos ganhos indiretos, que viriam com a redução de gastos em assistência social, saúde, bolsas-issos e vales-aquilo, já que grande parte da população ficaria ao abrigo de atividades produtivas (assalariados, autônomos, empresários e empreendedores, além de parte no Serviço Público).
Economistas, sociólogos e outros pesquisadores e estudiosos têm um campo desafiador nesse assunto: o quanto retorna, para a União, do dinheiro investido na instalação de um novo Estado. Como exemplo, cite-se o economista Roberto Limeira (raro caso de razão e paixão na pesquisa e estudos sobre o tema), que mostra por A + B, ou melhor, com todos os números: menos de dois e meio por cento (R$ 12 bilhões) do meio trilhão de reais do PAC, aplicados na criação de seis estados (Araguaia, Carajás, Gurguéia, Maranhão do Sul, São Francisco e Tapajós), geraria nessa área (incluindo-se o estado do Tocantins) um milhão de empregos e riqueza (PIB) de R$ 60 bilhões (atualmente, já são gerados R$ 40 bilhões). Somente com os impostos e divisas de exportação, em apenas dois anos a União teria o retorno de todo o investimento feito, sem falar nos ganhos sociais, políticos, de auto-estima, de consolidação do território nacional e a repercussão econômica e social nos demais estados, sobretudo os do Sul-Sudeste, que venderiam mais para os novos “irmãos” e “desincharia” parte de sua população, com a volta de muitos brasileiros para suas origens nortistas e nordestinas.
Geopoliticamente, dividir não é fragmentar, mas consolidar. Se a sede de dinheiro e poder, se os sem-moral e os sem-vergonha da política se aproveitam do sonho da redivisão territorial para cometer seus crimes, onde está a culpa: no sonho ou no vagabundo político que sordidamente se assenhoreia dele? Ora!... Contra a corrupção (e outros crimes) devem agir Justiça, Polícia, Ministério Público... e a cidadania vigilante. Se essas estruturas não são eficazes a ponto de prender esses políticos bandidos, reaver o dinheiro e conter a sangria desatada que vitima o povo, então é bom diagnosticar as razões da ineficácia, receitar o remédio e controlar sua administração (sem trocadinho).
Dividir mais para administrar melhor tem sido tendência e realidade no mundo inteiro. Só os que não se dedicam um pouco mais ao estudo, acompanhamento e análise podem se assentar em bases tão pouco sólidas quanto as alegações de falta de dinheiro e excesso de corrupção como fatores inibidores da redivisão territorial.
Nem o nosso planeta agüentou ser uma terra só. Saiu da condição de Pangéia, dividiu-se em dois supercontinentes e, no momento, são seis continentes. Até o começo do século 20 existiam pouco mais de 70 países. Agora, são quase duzentos. O que a Geologia começou, a Geografia confirmou: dividir faz bem -- e a Religião e a Filosofia ratificam. Divisão não é o mesmo que apropriação, corrupção. A redivisão territorial é a mais rápida e mais segura forma de promoção do desenvolvimento, de inclusão social. Com roubos e tudo.
A França, país quase do tamanho da Bahia, tem hoje 96 estados (départements), mais quatro além-mar e mais de 36 mil municípios (comunas). Quase 16 vezes maior do que o território francês, o Brasil existe com seus 26 estados e um distrito federal e menos de 5.700 municípios. Os Estados Unidos têm 51 unidades federativas cerca de 30 mil cidades. A Alemanha, com 356 mil km2 (quase o tamanho do Maranhão), tem 16 estados e mais de 12 mil cidades. A Espanha, com 505 mil km2 (bem menor que Minas Gerais), tem 50 estados (províncias) e oito mil cidades, total este semelhante ao da Itália, que é bem menor do que o Goiás.
Do “A” do Afeganistão ao “Z” do Zimbábue, a correlação entre área territorial e quantidade de estados (ou similares) encontra no Brasil o país de mais injusto desequilíbrio, especialmente quando a isso se juntam as desigualdades socioeconômicas.
A revista "Veja", que trouxe em 15/08/2007, um texto do paulista e paulistano Roberto Pompeu de Toledo (“O Maranhão do Sul na Wikipédia”), talvez não abrigue réplicas em igual espaço -- é a força da “ditadura” e do monólogo dos veículos de comunicação bem sucedidos, que impõem, quase sem reserva, o poder de sua mensagem para o resto do país e para leitores nos quatro cantos do mundo, ouvindo quase nada a população, mesmo quando o assunto tem importância vital sobre o presente e futuro dela.
O articulista Toledo talvez não saiba que a luta pela redivisão do lado sul do Maranhão tem mais de 180 anos. Que nossas riquezas naturais e culturais, a capacidade desbravadora e empreendedora de brasileiros de todo o país e de estrangeiros de todos os continentes fizeram e ainda vão transformar esta região em referência de progresso. O “estado de espírito” transmuta-se para “espírito de estado”.
Além de estarem incorretas as referências do artigo do sr. Toledo, elas pecam ao afirmar que o Estado do Maranhão do Sul, quando criado, “irá para a rabeira [sic]”. Por que, sr. Toledo, o Tocantins e o Mato Grosso do Sul não ficaram nessa “rabeira”? Pois saiba que a parte sul do Maranhão tem riquezas naturais, geografia estratégica e outras vantagens comparativas e competitivas. O que falta -- e disso o Brasil é cheio -- é decisão política para promover o desenvolvimento regional com envolvimento do capital humano intelectual e social aqui formado ou que para aqui se transferiu.
Falar de pólos agrograneleiros e agroenergéticos, recursos minerais e florestais, pecuária e indústria, comércio e agricultura, infra-estruturas etc. é necessário, mas, aqui, seria cansativo. Talvez em outra oportunidade.
Quem é contra a redivisão talvez deseje que o Brasil volte a ser um conjunto de capitanias. Talvez a paulista e paulistana “Veja” e o paulista e paulistano Toledo não se opusessem ao retorno de São Paulo ao território do Rio de Janeiro, a cujo governo “ficou sujeito, tanto administrativamente como no Judiciário”, como anotou Ildefonso Escobar. Ou, alternativamente, São Paulo reintegre-se ao território da Bahia, de cujo governo “ficou dependente” também. Talvez os paranaenses não se importem se seu estado voltar a pertencer a São Paulo. Talvez os paulistas não se incomodem (afinal, tudo é Brasil) de devolver ou buscar o que lhe é de direito em relação aos territórios de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Talvez a capital Curitiba e o estado de Santa Catarina voltem correndo para se reincorporar ao estado paulista. Talvez o Rio de Janeiro queira de volta a São Paulo que por algumas vezes lhe tiraram, em um puxa-encolhe que, como sanfona, resfolegou, veio e voltou do século 16 ao século 18.
O Maranhão do Sul será uma realidade -- não por força de “jogadas” de enfraquecimento político que nunca existiram. O Maranhão do Sul, mais dias menos dias, virá -- não por birra inútil ou vontade fútil. Não. Ele acontecerá como parte do debate nacional e da tendência e prática internacional de dividir mais (o território) para dividir melhor (seus recursos entre os cidadãos). Nestes momentos -- e também nos demais --, a corrupção não deve ser entendida como regra, mas como anomalia. Ela é um desvio de caráter humano, não uma característica de gestão da coisa pública, da Ciência Administrativa.
Em sonho, em lutas, em riquezas materiais, em potencialidades de toda ordem, o Maranhão do Sul é grande. É maior do que a ignorância daqueles que, por falta de interesse ou oportunidade, ainda não sabem do que estão falando.
Ou escrevendo.
(Para saber um pouco mais, visite: www.estadomaranhaodosul.blogspot.com.br).
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(*) EDMILSON SANCHES, jornalista, consultor e pesquisador, é autor de livros nas áreas de Administração, Comunicação e Desenvolvimento. Para adquirir seus trabalhos e contratar palestras, contate: (99) 3072-1046. E-mail: edmilsonsanches@uol.com.br .
Roberto Limeira: parabéns mesmo pela qualidade e sadia paixão (com responsabilidade) de seus textos.
Cá neste território, encontro de Nordeste com o Norte, também venho pelejando em favor da causa da endodivisão brasileira.
É impressionante como ignorância e interesses (quais?) não deixam ver a realidade quase tátil do futuro do Brasil com os novos estados -- o que seus artigos mostram e demonstram.
Que Deus nos dê vida e saúde suficientes para, sem a pequenez da vingança, comemorarmos daqui a alguns anos o acerto de nossas defesas, o poder de nossa visão, a validade de nossos humildes esforços.
Cumprimentos, amigo. Tem mais um nesse "front".
Edmilson Sanches
edmilsonsanches@uol.com.br
www.maranhaodosul.blogspot.com.br
(99) 3072-1046
(P. S. - Estou escrevendo a "Enciclopédia do Maranhão do Sul". Teus textos sobre o assunto "geopolítica"!, "redivisão territorial" etc. serão bem-vindos. Para remessas "físicas", utilize a Caixa Postal 61 - CEP 65900-970 - Imperatriz - MA).
Sou a favor de criar estado no Brasil, no máximo 50 (como os EUA), mas a região sul não pode de ficar de fora dessa. Aqui no sul estamos tentando criar um estado a mais de quarenta anos (o estado do Iguaçu - oeste do PR e SC juntos). P.S. Apoio a criação desses novos estados desde que apoiem o IG (sigla do estado do Iguaçu).
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